Por Marvia Scárdua de Carvalho no Migalhas
Ao assumir sua nova tarefa no atual governo, a ministra de Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Maria Evaristo, recebeu um documento intitulado “Denúncia ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania”, que versa sobre suposta violação de direitos relacionados a regimes semi-manicomial em terapias para pessoas autistas, elaborado por três entidades que se dedicam ao debate sobre os cuidados com as pessoas com TEA.
O documento acusa o método ABA, de se criar condições desumanas nas relações com pacientes. Acusa ainda um conjunto de clínicas de se especializarem de modo inadequado para atenderem esse público, sabidamente com alto índice de identificação e necessidades de tratamentos específicos.
Para a ministra Macaé Maria Evaristo e demais ministros e autoridades envolvidos no assunto, o documento traz acusações infundadas sobre o método ABA. A partir de um conjunto de suposições sem nenhuma demonstração científica, essas entidades consideram o método equivocado por um critério meramente ideológico, ou por uma “verdade” criada entre seus membros.
Sou mãe de um garoto autista de suporte 2 e travo, juntamente com milhares de mães e com o apoio importante da comunidade científica brasileira, a defesa dos direitos das pessoas PcD´s e portadores do TEA. Uma luta incessante contra a mercantilização dos tratamentos, ao mesmo tempo, pelo amplo acesso dessas pessoas ao necessário tratamento. Afirmo, ao lado da comunidade científica qualificada para esse assunto, que o método ABA é eficiente e capaz de levar melhorias significativas de qualidade de vida e até a desejada autosuficiência para pessoas com suporte 2 e 3 de autismo.
É doloroso ver como, em meio a uma questão tão delicada e urgente, alguns grupos preferem polarizar e generalizar em vez de unir forças em prol do que realmente importa: o bem-estar e o futuro das pessoas autistas. Cada família que enfrenta o desafio de cuidar de um filho autista sabe o peso dessa responsabilidade e o quanto é necessário ter acesso a terapias adequadas, como o ABA, que oferecem uma chance real de desenvolvimento e independência.
Autistas e suas famílias de nível de suporte 2 e 3 lutam diariamente para dar voz a quem, muitas vezes não pode falar por si. Conhecem de perto a complexidade das necessidades de seus filhos, a luta contra o preconceito e a falta de recursos, mas acima de tudo, carregam no peito o amor incondicional que os motiva a buscar sempre o melhor. Por isso, é devastador que essas famílias sejam, de certa forma, ignoradas por discursos que não refletem a realidade e nem tampouco a maioria de pessoas autistas e com transtornos associados, como esquizofrenia e deficiência intelectual, (nível 2 e 3 de suporte).
Todos nós somos contrários a diagnósticos precipitados e à criação de terapias padronizadas, intensivas e inflexíveis, que ignoram a individualidade de cada pessoa. No entanto, o ataque de forma generalizada e sem qualquer embasamento científico é um grande desserviço.
Nossa luta tem de ser na garantia de tratamentos cientificamente comprovados aos autistas de todo o País. Para que todos e todas tenham acesso a profissionais realmente capacitados e a terapias que buscam, sobretudo, uma melhor qualidade de vida e autonomia para essas pessoas, sendo avaliadas de acordo com sua individualidade e necessidades.
Este não é um debate trivial. Não estamos a discutir conceitos abstratos e ultrapassados, mas, sim, o futuro de vidas humanas que dependem de decisões tomadas agora, que não podem se basear em opiniões infundadas, negacionistas e sem base científica comprovada.
Marvia Scárdua de Carvalho- Assistente Social, advogada e mãe atípica. Mestranda em Direito Político e Econômico no Mackenzie. Diretora do Sindicato dos advogados de São Paulo- SASP e da Associação dos advogado(as) em Defesa da Democracia, Justiça e Cidadania -ADJC.