A homenagem foi direcionada a movimentos sociais e pessoas comprometidas a mudarem a realidade do povo negro e ao combate ao racismo.
Por Marina Azambuja
A Comissão de Igualdade Racial e Verdade sobre a Escravidão (CIRVE) do Sindicato das Advogadas e Advogados do Estado de São Paulo (SASP) realizou nesta quinta-feira (18) a cerimônia da 2° Comenda Maria da Penha em reconhecimento às personalidades e entidades que lutam em defesa da Igualdade Racial no país.
A cerimônia que ocorreu no plenário da Câmara Municipal de São Paulo foi conduzida pelos advogados e coordenadores da CIRVE, Jonadabe Laurindo e Sandra Monção, e teve o objetivo de homenagear o juiz Edinaldo César Santos Júnior, a deputada e sambista Leci Brandão, que não pôde comparecer e foi representada por Rozina de Jesus, e a Central Única das Favelas (CUFA), que foi representada pela diretora Maura Oliveira e Marcivan Barreto. O Movimento Negro Unificado (MNU) também foi homenageado e representado pelos ativistas Regina Santos e Milton Barbosa.
O evento que encheu o auditório contou com a presença de diversos juristas, sindicalistas e representantes de movimentos sociais, além do vereador João Ananias.
Durante a abertura do evento o presidente do SASP, Fábio Gaspar, destacou a importância da advogada Maria da Penha que se empenhou arduamente pela dignidade dos advogados negros, que atualmente compõem 30% do corpo do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a simbologia de sua luta na advocacia trabalhista.
“A dra. Maria da Penha rompeu as fronteiras, a sua luta não está apenas no estado de São Paulo. A memória da Penha continua viva, por isso é necessário dar a devida importância a esse prêmio.”
O primeiro a ser homenageado foi o juiz Edinaldo César Santos Júnior, que também é formador da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM) na disciplina Questões Raciais e juiz auxiliar da presidência do CNJ. Durante seu discurso, Edinaldo falou sobre sua trajetória como advogado negro até entrar na magistratura e como Maria da Penha lhe deu forças para romper barreiras e seguir em frente.
“Os juízes pretos fazem parte de 1,6% dos juízes da magistratura brasileira. Mas eu não cheguei à magistratura sem passar pela advocacia, fui um advogado negro e foi nesse momento que eu conheci a Maria da Penha…Eu vi o que ela vinha desenvolvendo nessa luta antiracista e antidiscriminatória. De lá pra cá muitas coisas mudaram.”
A segunda premiação foi entregue em homenagem à sambista e deputada estadual, Leci Brandão, que se dedica especialmente à promoção da igualdade racial, ao respeito às tradições de matriz africana e à defesa da cultura popular brasileira. Segunda deputada negra da história da Alesp, Leci também levanta a questão das populações indígenas e quilombolas, da juventude, em especial pobre e negra, das mulheres e do segmento LGBT. Por motivos de saúde, Leci não pôde estar presente e por isso foi representada por sua assessora Rozina de Jesus.
“Gostaria de dar os parabéns ao Sindicato das Advogadas e Advogados por fazer esse evento. Aqui não estamos falando apenas de um país, mas também que, infelizmente, em que enfrentamos as desigualdades, o racismo, o machismo e todas as diferenças.”
Em seguida, a Central Única das Favelas (CUFA) foi homenageada por seu trabalho prestado nas comunidades de todo o país, principalmente durante a pandemia, a qual deixou boa parte das favelas desamparadas. A entidade também incentiva projetos focados no comércio local e fez parceria com o SEBRAE-SP e também conseguiu com que o aplicativo UBER funcionasse na comunidade Heliópolis, tornando-se a primeira favela a receber motoristas de aplicativo.
“A CUFA viveu momentos de assistencialismos, mas não somos apenas assistencialistas. Quem conhece o histórico da CUFA sabe o quanto lutamos pela igualdade, pela luta de gênero, por uma vida melhor e mostrar que as favelas são potentes. Somos 16 milhões de brasileiros morando em favelas no Brasil e movimentamos R$180 bilhões por ano. Não somos carentes.”
Os ativistas e o Movimento Negro Unificado (MNU), Milton Barbosa e Regina dos Santos, também foram prestigiados. Criado em julho de 1978 nas escadarias do Theatro Municipal de São Paulo, o MNU tornou-se uma das entidades mais importantes em seu gênero no país, sendo uma referência para muitos outros grupos. Saindo das salas de debates, conferências e atividades lúdicas, para ações de confronto aos atos de racismo e discriminação racial, elaborando panfletos e jornais, realizando atos públicos e criando núcleos organizados em associações recreativas, de moradores, categorias de trabalhadores, nas universidades públicas e privadas.
“Que felicidade receber uma Comenda com o nome da minha amiga dra. Maria da Penha Santos Lopes Guimarães. Eu tive o privilégio de compartilhar muitas coisas com ela. A Penha dizia da importância de estarmos juntos na advocacia na cidade de São Paulo, no Estado de São Paulo e no Brasil. Neste país extremamente racista, talvez, dos três poderes o que mais interfere diretamente na nossa vida, na do povo negro é o o judiciário. O quanto temos que trabalhar ainda para que o judiciário brasileiro não nos enxergue como corpos perigosos” Disse Regina dos Santos.
“A Maria da Penha foi uma mulher incrível e com uma experiência muito rica que ajudou a construir pessoas maravilhosas. É uma satisfação imensa estar aqui com vocês com a certeza de que estamos avançando e vamos realmente derrotar o racismo estrutural e institucional neste país.” Afirmou Milton Barbosa.
Durante a entrega da Comenda Maria da Penha, a dupla de músicos Luana Silva e Bruno Lúcio comandaram as canções e o artista Marcelo dos Santos foi o responsável pelo sapateado e intervenção artística.
Comenda Maria da Penha
A premiação carrega o legado e a memória da Dra. Maria da Penha Santos Lopes Guimarães, ex-diretora do Sindicato das Advogadas e Advogados do Estado de São Paulo, ex-integrante da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da OAB, ex-conselheira e ex-presidente da Comissão do Negro e Assuntos Antidiscriminatórios da OAB-SP, ex-integrante da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo, Criadora e Impulsionadora da Marcha Noturna pela Igualdade Racial e presença significativa em todas as entidades advocatícias.
A primeira edição do prêmio ocorreu em novembro de 2019, no Al Janiah e homenageou a UNEAFRO e os advogados Maria Sylvia de Oliveira e Sinvaldo José Firmo.
Dra. Maria da Penha faleceu em 2016, deixando um vasto legado de luta pelas prerrogativas da advocacia negra e sobretudo pela ascensão da mulher negra na advocacia e espaços de poder.