A democracia participativa e a revogação popular de mandatos (recall) : alternativas ao déficit democrático brasileiro

por | jun 18, 2019 | Jornal do Sindicato | 0 Comentários

IMG 5015 Por: Gabriela Araujo 

[Artigo escrito em co-autoria com a Profª. Juliana Cardoso Ribeiro Bastos e publicado originalmente na Revista Brasileira de Estudos Constitucionais.]

 

1.       INTRODUÇÃO

 Na mais recente avaliação divulgada pela “Freedom House”, agência americana que monitora o grau de democracia no mundo, entre os anos de 2006 e 2015, houve uma queda significativa nos índices de direitos políticos e liberdades civis medidos pela instituição, e o número de países que pioraram seu status democrático era quase o dobro dos que melhoraram sua situação[1].

Posicionando o Brasil dentro desse contexto de retrocesso democrático, o estudo de opinião pública “Latinobarómetro”, que aplica anualmente mais de 20.000 entrevistas em 18 (dezoito) países da América Latina, desde 2013 vem trazendo dados alarmantes sobre o grau de confiabilidade da população brasileira na democracia e nas instituições democráticas nacionais.

No estudo realizado no ano de 2017[2], apenas 13% dos brasileiros consultados se declararam satisfeitos com o funcionamento da democracia[3] no país, enquanto que o grau de percepção de democracia não saiu da pontuação mínima, sempre em último lugar comparativamente aos outros 17 (dezessete) países avaliados.

Apesar de 43% dos entrevistados aprovarem a democracia como melhor modelo de organização política, todos os gráficos que dizem respeito à credibilidade da população nas instituições democráticas, como aprovação (6%) e confiança (8%) no governo, sensação de que o governo é para poucos grupos poderosos em detrimento da maioria (97%), confiança no parlamento (11%), confiança nos partidos políticos (7%), entre outros, revelam que o Brasil hoje ocupa a pior posição no ranking democrático da América Latina[4], já que a própria população não se sente contemplada pelos seus supostos representantes no Executivo e no Legislativo.

Pode-se dizer que são diversos os fatores que convergem para o déficit democrático brasileiro atual, como: os efeitos ainda imensuráveis do recente (2016) impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, por muitos considerado como “terceiro turno” eleitoral; o presidencialismo de coalizão importado do modelo norte-americano sem os mecanismos de freios e contrapesos adequados ao modelo brasileiro; o sistema proporcional em lista aberta para preenchimento de vagas do Poder Legislativo; a multi-fragmentação partidária no Congresso Nacional, inversamente proporcional a um programa/ideário definido com o qual a população possa se identificar; a forma de nomeação dos integrantes dos tribunais superiores e a ausência de mandatos temporários; a concentração da mídia (baixa democratização) em seletos conglomerados econômicos; o desuso deliberado dos mecanismos de participação popular previstos na Constituição Federal; a ausência de mecanismos de controle social e prestação de contas dos representantes populares eleitos; entre outros.

No entanto, o presente trabalho terá como objeto de estudo apenas os dois últimos fatores acima citados, considerados pelas autoras como os principais responsáveis pela crise democrática enfrentada pelo Brasil – ou seja, a ausência ou o desuso de mecanismos efetivos de participação popular e de controle social dos mandatos, que levam a um afastamento cada vez maior entre o povo e seus representantes eleitos e até mesmo a uma perigosa aversão à política disseminada na população em geral.

Enquanto que em outros países democráticos da Europa e da própria América Latina referendos e plebiscitos são utilizados usualmente, principalmente quando se trata de alterações ao texto constitucional, por outro lado, em dezembro de 2017, o Brasil alcançou o patamar de 99 (noventa e nove) emendas à Constituição Federal, sem que qualquer consulta popular tenha sido realizada para aprovar tais emendas.

Por sua vez, há que se considerar que a deslealdade programática dos mandatários eleitos, bem como o afastamento intencional que promovem da participação popular nas suas tomadas de decisão, ocorrem apenas em razão da inexistência de mecanismos de controle social e de accountability, em nosso ordenamento jurídico, que permitiriam à sociedade exigir uma prestação de contas mais efetiva daqueles que em tese deveriam lhe representar.

Antes de se adentrar em uma análise mais crítica e buscar soluções para o déficit democrático brasileiro, porém, não há como deixar de analisar premissas e conceitos introdutórios, que englobam desde a evolução do Estado Democrático de Direito e a noção de democracia direta como item indispensável à sua sustentação atual, até a abordagem dos principais institutos de democracia direta que já estão previstos na Constituição brasileira, apesar de subutilizados.

Desta forma, enquanto os dois primeiros capítulos são mais descritivos e dedicados à contextualização da realidade jurídica do modelo democrático nacional, os dois últimos capítulos buscam a problematização e a solução da crise de representatividade que atravessa o país, utilizando-se, para tanto, de dados extraídos do Direito comparado, principalmente de países em que a democracia participativa é uma realidade.

Sob esse aspecto, um instrumento de participação popular que não é adotado no Brasil, mas que poderia apresentar-se como uma solução para potencializar a utilização de todos os demais, é a revogação popular de mandatos (ou recall).

O controle social dos mandatos, exercido pela possiblidade do recall, serviria como instrumento de pressão para uma prestação de contas mais constante e interativa, bem como incentivaria os mandatários a abrirem uma esfera pública de debate institucional que hoje se encontra inviabilizada por óbices burocráticos propositais. Entretanto, a adoção de tal instituto, se não precedida de diversas cautelas, pode ser mais prejudicial do que benéfica à estabilidade democrática.

Como encontrar o equilíbrio entre democracia representativa e democracia direta, portanto, e a quais institutos se deve recorrer, são os principais desafios do presente estudo.

 

2. EVOLUÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E A INSUFICIÊNCIA DA DEMOCRACIA EXCLUSIVAMENTE REPRESENTATIVA NO SÉCULO XXI

 A democracia é identificada como um dos principais regimes de governo adotados pelos Estados. Contudo, atualmente, o modelo democrático desperta questionamentos sobre sua real efetividade. Nesse sentido, a célebre expressão de Abraham Lincoln, “a democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo”, enfrenta sérias dificuldades institucionais, que, aliás, já eram previstas por Aristóteles, para quem a democracia comportaria uma forma desnaturada toda vez que a maioria não se guiasse pelo autêntico bem comum.

Inegável, porém, que o Estado Democrático de Direito deve ser considerado como uma conquista e, até o momento, como o modelo que melhor atende o exercício das liberdades individuais e direitos fundamentais. Por isso, um primeiro ponto a ser desenvolvido diz respeito à compreensão sobre o seu surgimento, considerado como uma quinta etapa na evolução do Estado[5].

Pois bem.

A ideia moderna de um Estado Democrático tem suas raízes no século XVIII. A fixação desse ponto de partida é ressaltada como sendo um marco para a afirmação de certos valores fundamentais da pessoa humana, bem como para a exigência de organização e funcionamento do Estado.      

Como base do conceito de Estado Democrático encontra-se a noção de “governo do povo”, revelada pela própria etimologia do termo “democracia” como sendo poder do povo (demos + kratos).

Contudo, o que se percebe é que a essência desse conceito se encontra atrelada a cada momento histórico desde a Grécia antiga, quando o povo participava das decisões políticas por meio de votações realizadas em praças públicas.[6]

Foram as circunstâncias históricas que inspiraram tal preferência, sendo, de modo especial, três grandes movimentos político-sociais os responsáveis pela consagração da democracia como regime de governo: a Revolução Inglesa, a Revolução Americana e a Revolução Francesa.

A partir desses acontecimentos históricos, é possível identificar no ideal democrático três pontos fundamentais: a supremacia da vontade popular, a preservação da liberdade e a igualdade de direitos.

Destaca-se o ponto referente à supremacia da vontade popular, responsável pela discussão dos modelos de participação do povo na tomada das decisões políticas em uma sociedade. Nota-se que a democracia seguiu durante muito tempo a doutrina da “duplicidade” e que foi apenas com o seu declínio no século XX que se passou a adotar o princípio democrático da “identidade”.

Essa mudança no modo de realizar a democracia auxilia a compreender os problemas nela apontados hoje, decorrentes da falta de identificação entre governantes e governados. Isso porque a superação da ideia de autonomia plena do representante eleito (sistema representativo de feição liberal) pela ideia de identidade e suprema harmonia da vontade dos governantes com a vontade dos governados, faz com que o estado atual da representação política, especialmente no Brasil, receba críticas quanto ao seu funcionamento democrático.

Decorrente desse modelo, apresentam-se discussões em torno da efetividade de sua representação, da extensão do direito de sufrágio e dos sistemas eleitorais e partidários. Exatamente questões em torno das quais discute-se na atualidade a democracia no Brasil, sendo possível identificar problemáticas em todas essas esferas que envolvem a participação popular no governo.

Nesse sentido, quer se dizer que, sendo o Estado Democrático de Direito aquele em que o próprio povo governa, surge a questão do estabelecimento dos meios para que o povo possa externar sua vontade. Talvez um dos grandes desafios a serem enfrentados no próprio conceito de democracia. Afinal, o Estado Democrático de Direito é justamente aquele que buscou a introdução do povo no processo político como agente direto e não somente pela via representativa.[7]

A partir dos desafios enfrentados hoje em relação à democracia, a dificuldade na democracia indireta reside em precisar com rigor quais as relações que existem entre representante e representado. Ou, nos dizeres de BASTOS (2002, p. 133): “Será que o representante reflete ou espelha necessariamente a vontade do representado? Ou será que o representante, livremente, toma as decisões segundo os seus próprios critérios, os quais, por um fenômeno de imputação, acabaram atribuídos ao representado?”.

A resposta a esses questionamentos tem apontado a insuficiência do modelo exclusivamente representativo e sugerido novas formas para buscar o controle social na tomada de decisões políticas para solucionar o problema da falta de legitimidade democrática.

Há que se permitir a real participação do povo nas decisões políticas para que a ideia de identidade democrática possa ser efetivada, mas direcionando-se adequadamente o modus participativo dos governados na sociedade, até mesmo para que a democracia não se revele em tirania de uma maioria, como já se preocupava Alexis de Tocqueville, em sua obra “Democracia na América”, na qual destaca que todo exercício ilimitado do poder, fosse por um déspota individual, fosse por uma maioria política, estaria fadado a terminar em desastre. Por isso, indica a necessidade de limites à política liberal.

A existência de limites ao regime da maioria torna-se, inclusive, essencial à própria noção de democracia, que não pode ser compreendida apenas como o governo de uma maioria, mas sim um governo que protege, também, os direitos das minorias, sejam elas étnicas, religiosas ou intelectuais, entre outras. Isso porque quando essa proteção desaparece, terminamos todos perdendo as liberdades que a democracia supostamente deveria defender.  

Eis que, diante da atual complexidade das sociedades, diante de colégios eleitorais numerosos e, ainda, diante de muitas decisões políticas que devem ser tomadas frequentemente, torna-se um desafio a realização de consulta popular para cada uma dessas situações.

DALLARI (2012, p. 152) chega a afirmar que esse tipo de manifestação popular é “quase absurdo mesmo”. Assim, não se têm dúvidas que em modelos sociais menores haveria a possibilidade do exercício da democracia direta[8], enquanto que, ainda, é um grande desafio a sua implementação nos atuais modelos complexos de sociedade[9].

Porém, tal desafio deve ser superado, sob pena de implosão do próprio sistema democrático.

O elevado descontentamento com o modelo de democracia indireta (ou representativa) e o crescente déficit democrático têm despertado, desde o final do século XX, discussões sobre a necessidade, em maior medida, de utilização dos instrumentos de participação direta na tomada das decisões políticas na sociedade.

Para alguns, o esgotamento do modelo exclusivamente representativo se deve, entre outros motivos, ao desenvolvimento da informática que, hoje, demonstra ser uma das formas mais democráticas para o exercício da liberdade de manifestação do pensamento e compete frontalmente com a burocratização dos órgãos governamentais oficiais, que não conseguem acompanhar a evolução tecnológica e a velocidade com que as informações e a comunicação transitam pelas redes sociais.

Nesse sentido, BASTOS (2002, p. 325), ao tratar do Estado do Futuro, bem valeu-se das palavras de Fritz Wolf para questionar se por meio do espaço público proporcionado pela internet, estaria surgindo um instrumento de democracia direta?!

Para Larry Diamond, por sua vez, “vivemos uma recessão da democracia”, cujas causas estão no aumento da desigualdade no mundo e no baixo crescimento, assim como desafios de ordem política como os movimentos contra o assentamento de imigrantes e o crescimento de partidos de extrema direita.[10]

Já FABRE-GOYARD (2003, p. 342-344), não fala em uma recessão democrática, mas acredita em uma “crise” sobre a democracia nos dias atuais. Para ela, “no pluralismo do mundo democrático, governar os indivíduos que reivindicam o tempo todo, com direitos cada vez mais numerosos, sua igualdade com qualquer outro e sua liberdade sem limites é uma tarefa das mais delicadas”. Não obstante, reconhece que não há e jamais haverá democracia perfeita. Ela mostra que, “justamente pelo pluralismo que é a sua alma, a democracia é particularmente vulnerável”.

Como se vê, a democracia apresenta-se como um modelo naturalmente problemático, mas que, ainda assim, é considerado o melhor regime de governo existente até hoje, em razão do poder estar nas mãos do povo e, por conta disso, como bem explica DALLARI (2012, p. 150), “considerar implícito que o povo, expressando livremente sua vontade soberana, saberá resguardar a liberdade e a igualdade”.

DROMI (1997, p. 107-116) desenvolve os valores do “porvir” e propõe seis ideias fundamentais que deverão constar nas Constituições futuras, sendo uma delas a participação. No que denomina como Constituição participativa, defende a necessidade de uma democracia mais participativa: “As Constituições reformadas convocarão o povo e seus dirigentes a uma participação ativa, integral e equilibrada, comprometida e responsável”.

Ainda assim, se a solução se apresenta por meio do fortalecimento da democracia direta ou participativa, essa também enfrenta desafios importantes a serem superados, principalmente no modelo constitucional brasileiro, como veremos a seguir.[11]

 

3. OS DESAFIOS DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA NO BRASIL

 Se, por um lado, a Constituição de 1988[12] significou um importante marco para a transição democrática brasileira, ao incorporar o modelo de democracia semidireta[13], com a previsão de formas de participação direta e indireta do povo na tomada das decisões políticas, por outro lado, o que se verifica é uma baixíssima e insatisfatória utilização dos instrumentos de participação direta nela previstos.

Senão, vejamos.

Dentre os institutos que concretizam a democracia direta previstos na Constituição Federal e no sistema jurídico brasileiro, destacamos o plebiscito, o referendo, o projeto de lei de iniciativa popular, a ação popular, as audiências públicas e os conselhos participativos.

Entretanto, os principais deles: referendo, plebiscito e projeto de lei de iniciativa popular são aqueles que maiores óbices encontram à sua concretização.

O referendo consiste na consulta popular em momento posterior à tomada de decisão para validá-la ou não. Por esse motivo alguns autores falam do referendo como plebiscito confirmatório. Trata-se de instituto utilizado pelas antigas Dietas das Confederações Germânicas e Helvéticas, quando todas as leis eram aprovadas ad referendum do povo.

Diferencia-se do plebiscito na medida em que este caracteriza-se pela consulta popular a priori sobre um determinado assunto. Dependendo do resultado do plebiscito é que se irão adotar providências legislativas, se necessário. Nesse caso, há uma importância grande na clareza e determinação da pergunta a ser feita para o eleitorado, bem como a sua prévia[14] e ampla discussão pela sociedade.

No Brasil, tais institutos encontram-se regulamentados pelo artigo 3° da Lei n° 9709/98, que estabelece que, nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislativo e ou do Poder Executivo, e no caso do parágrafo 3° do artigo 18 da Constituição, o plebiscito e o referendo são convocados mediante decreto legislativo, por proposta de um terço, no mínimo, dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional. Cabe destacar que a competência para autorizar referendo e convocar plebiscito é exclusiva do Congresso Nacional por determinação Constitucional (artigo 49, XV).

Disso decorre que a utilização desses instrumentos da democracia direta fica submetida à vontade dos representantes do povo e não dele diretamente, o que acaba implicando numa falsa efetivação de democracia participativa. Eis porque são poucas as experiências práticas com esses institutos no Brasil.

A primeira vez que o cidadão brasileiro participou desse tipo de tomada de decisão política foi em 1993, por meio de plebiscito, para a escolha entre a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (presidencialismo ou parlamentarismo) a serem adotados, e porque a própria Constituição já previa esse evento, no artigo 2° do ADCT.

Referido plebiscito estava previsto para o dia 07 de setembro de 1993, mas foi antecipado para o dia 21 de abril de 1993 pela Emenda Constitucional nº 2/92, em que ficou decidido pelos cidadãos brasileiros pela manutenção da república constitucional e do sistema presidencialista de governo.

Outra oportunidade de participação popular direta foi apenas em 23 de outubro de 2005, em referendo realizado para aprovar ou rejeitar a proibição da comercialização de armas de fogo e munição no país. O artigo 35 da Lei 10.826/2003 proibiu a comercialização de armas de fogo e munição em todo território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para os integrantes das entidades relacionadas no artigo 6° da Lei. Para que esse dispositivo entrasse em vigor era necessário obter a sua confirmação mediante referendo popular, oportunidade em que a consulta foi feita nos seguintes termos: “o comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?”. Segundo dados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral, o “não” recebeu 59.109.265 votos (63, 94%) e o “sim” recebeu 33.333.045 votos (36,06%), sendo possível o comércio de armas de fogo e munição.

Mais um caso, em nível apenas regional, foi a utilização do referendo no Estado do Acre para decidir sobre o fuso horário. A partir da questão: “Você é a favor da recente alteração do horário legal promovida no seu Estado?”, os eleitores do Acre decidiram pelo retorno do fuso horário antigo, de duas horas de diferença em relação a Brasília.

Aliás, a mais recente consulta popular implementada por meio de plebiscitos aconteceu também regionalmente, dessa vez no Estado do Pará, e deveu-se à necessidade de se decidir sobre a formação dos Estados do Carajás e do Tapajós. Em referida consulta popular, em ambos os casos, mais de 66% dos votos válidos foram contra a criação de novos Estados.

Com relação aos projetos de lei de iniciativa popular, que são aqueles por meio dos quais determinado número de cidadãos tem a mesma faculdade que os demais agentes públicos dotados de capacidade para deflagrar o processo legislativo, há que se destacar a dificuldade de se preencher os requisitos constitucionais para sua realização, pois exige-se, para a produção de lei em âmbito federal, a apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído por, pelo menos, cinco Estados, com não menos que 0,3% dos eleitores de cada um deles (artigo 61, parágrafo 2°).

Decorrente disso, doutrinariamente, apontam-se apenas quatro projetos de lei de iniciativa popular aprovados na história da Constituição de 1988, e ainda assim deflagrados formalmente por outros legitimados para sua propositura, já que, apesar do amplo apoio popular, não conseguiram superar os óbices burocráticos – como ausência de assinatura digital, por exemplo – e formais para sua viabilização.[15]

Os demais institutos previstos no ordenamento jurídico brasileiro, que se pode considerar também como meios de participação popular, apesar de não interferirem diretamente no processo legislativo, e talvez justamente em razão disso, são mais utilizados e encontram menos óbices burocráticos.

A começar pela ação popular, que, prevista no artigo 5°, inciso LXXIII, da Constituição, pode ser proposta por qualquer cidadão para obter a invalidação de ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

Nota-se que se trata de um instrumento de defesa dos interesses da coletividade utilizável por qualquer cidadão (compreendido aquele que se encontra no gozo dos seus direitos políticos). A respeito, MEIRELLES (2014, p. 179) afirma, porém, que esta ação “vem sendo desvirtuada e utilizada como meio de oposição política de uma Administração a outra, o que exige do Judiciário redobrada prudência no seu julgamento”.

A propósito dos demais mecanismos de participação popular – audiências públicas e conselhos participativos-, observa Dalmo de Abreu Dallari que alguns desses institutos não são considerados por todos como expressão da democracia direta, já que não dão ao povo a possibilidade de ampla discussão antes da deliberação.

As audiências públicas, apesar de pouco divulgadas e com baixa adesão das grandes massas, constituem um instrumento de participação popular por meio do qual permite-se um debate mais interativo entre a sociedade e o Estado, já que se trata de um espaço aberto em que o povo tem a atenção do Estado para que suas pretensões e queixas sejam apresentadas ou, ainda, simplesmente para ter o conhecimento a respeito do objeto da audiência pública.

Na Constituição Brasileira, encontram-se previstas em vários dispositivos, como o disposto nos artigos 10, 187, 194, 204, II, e, especialmente, no artigo 1° –  “todo o poder emana do povo”.

Cabe acrescentar que as audiências públicas, no sistema brasileiro, também foram incorporadas ao Poder Judiciário. Inicialmente previstas pelas Leis n. 9868/99 e 9882/99, elas foram regulamentadas pela Emenda Regimental 29/2009, que atribuiu competência ao Presidente ou ao Relator para convocar audiência pública para ouvir o depoimento de pessoas com experiência e autoridade em determinada matéria, sempre que entender necessário o esclarecimento de questões ou circunstâncias de fato debatidas no Tribunal, com repercussão geral e de interesse público relevante.

Contudo, é recente sua utilização: a primeira audiência pública realizada pelo Tribunal foi convocada pelo Min. Carlos Ayres Britto, Relator da ADI 3510, que impugnava dispositivos da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), e ocorreu no dia 20 de abril de 2007.

Por fim, os conselhos participativos, pouco conhecidos pela maioria, reafirmam o propósito de um governo aberto. Eles podem ser criados nas diversas esferas de governo com a finalidade de ouvir o que o povo tem a dizer.

Como se depreende do que foi até aqui exposto, a democracia se realiza por feições diferentes, a depender das escolhas que sejam feitas quanto à forma de participação do povo na tomada de decisões políticas.

O que deve despertar real preocupação, porém, é a conformação de um Estado de Direito que se pretenda democrático, sem a real participação política do povo, em razão de aspectos como a baixa utilização dos meios de participação direta previstos pela Constituição e, também, a falta de legitimidade democrática vivenciada atualmente pelos brasileiros.

Diante da generalizada convicção de que o povo é mal representado nos parlamentos, urge identificar as insuficiências dos métodos de participação popular existentes e aperfeiçoá-los no sentido de obter um maior controle pelo povo das decisões políticas brasileiras.

 

4. A SUBUTILIZAÇÃO DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA NA ORIGEM DO DÉFICIT DEMOCRÁTICO: UMA CRISE GLOBAL

 A consolidação da democracia como premissa do constitucionalismo e como modelo de mundo civilizado foi uma grande conquista nos meados do século passado, período que se sucedeu à queda de regimes totalitários violentos e muito traumáticos para o mundo ocidental, sobretudo na Europa.

No entanto, os modelos democráticos que conhecemos hoje parecem não estar conseguindo acompanhar com a mesma rapidez a evolução das relações sociais e sua diversidade no mundo globalizado. Há novas demandas da humanidade diante dos avanços tecnológicos conquistados, que as modernas democracias têm dificuldade de absorver, principalmente com a velocidade com que as comunicações e informações passaram a circular após o advento da internet e das mídias sociais.

É preciso modernizar a democracia, repensar novas formas de participação popular e de representatividade política, na mesma proporção e intensidade com que se debate a evolução do constitucionalismo.

O problema do déficit democrático, que ameaça a própria manutenção do Estado Democrático de Direito, não é uma exclusividade brasileira. O ser humano que ontem se contentava em simplesmente ter direito a votar em representantes delegados e não ser violado em suas liberdades individuais por um Estado absolutista, hoje quer muito mais: quer ter direito ao voto e também à voz, a uma participação mais ativa nas decisões políticas que lhe afetam.

O modelo exclusivo de democracia representativa já está ultrapassado e não atende mais os anseios da sociedade globalizada, que se insurge contra ele em todas as partes do mundo e quase que concomitantemente: entre 2011 e 2013, tivemos relevantes movimentos de revolta contra o esvaziamento democrático, desde o “Occupy Wall Street”, nos Estados Unidos, até os protestos de junho de 2013, no Brasil.

A União Europeia atravessa uma grave crise institucional, que teve como ápice o Brexit, justamente em razão desse déficit democrático: os cidadãos europeus não conseguem entender o excesso de procedimentos burocráticos adotados, reclamam da falta de transparência das decisões e da falta de abertura para interação, e acabam se desinteressando tanto pelos assuntos da União, que com ela não conseguem mais se identificar.

O descontentamento geral com a democracia representativa reside, principalmente, na relação distanciada entre o cidadão e seus representantes eleitos. Com o advento das redes sociais, dos smartphones e das mais modernas formas de comunicação social, não há mais justificativa para que um parlamentar não se mantenha em constante interação e consulta à sua base.

Por outro lado, são cada vez mais corriqueiros os casos em que os cidadãos observam passivamente aqueles que deveriam, em tese, representar seus interesses, pelo contrário, votarem e decidirem por pautas absurdamente diversas daquelas que haviam sido propostas antes de serem eleitos.

E o que fazer diante desse tipo de infidelidade representativa? Na maioria dos países, resta aos eleitores aguardarem novas eleições e o momento da troca de seus representantes, quando então não depositariam mais sua confiança naqueles que os decepcionaram. Porém, nada impede que os novos representantes eleitos também assumam a mesma patologia do distanciamento democrático, o que acaba por formar um ciclo vicioso longo e de difícil solução.

Além disso, a influência do sistema financeiro e de grandes corporações faz com que a desinformação e o “marketing” político ludibrioso predominem nas campanhas eleitorais, induzindo o eleitor comum a aceitar involuntariamente que se concentre nas mãos de uma minoria o poder decisório sobre a vida da maioria, paradoxalmente invertendo os valores democráticos.

O Brasil, de tradição colonial, oligárquica, e pouca experiência democrática, vive ainda sob forte influência das teorias do elitismo democrático que dominaram o século XX e que hoje começam a ser ultrapassadas ou pelo menos questionadas nos países mais desenvolvidos.

Nesse sentido, muito embora a democracia direta tenha previsão expressa na Constituição de 1988, na prática, há uma conjunção de forças sociais e políticas dominantes que a desencorajam, pelo temor de uma suposta irracionalidade das massas, que por sua vez acaba levando à confiança cega na racionalidade das elites e resultando em uma agenda política intra-elites que despreza as massas.

Aliás, DOWNS (1956) poderia ter se espelhado no Brasil quando equiparou a lógica democrática à lógica competitiva e adversarial da economia, ao concluir que os partidos políticos não têm como objetivo formular programas de governo, mas ganhar eleições[16], e, em razão da disputa pelo poder e somente visando a manutenção do poder, é que os governantes e representantes eleitos maximizariam os benefícios a serem concedidos aos indivíduos, o que, em nosso ver, reflete exatamente a base de troca à moda mercantil que contaminou a pluralidade de partidos políticos existentes no país, a maioria sem um programa definido, mas todos dominados por setores econômicos ou familiares representantes das elites.

Afinal, sob esse viés, o bem comum, em nenhum momento, seria o objetivo a ser perseguido, mas apenas uma consequência da racionalidade do sistema democrático, em que a sociedade ficaria reduzida a uma mera articulação descentralizada da demanda de indivíduos maximizadores de utilidade.

Como consequência, e segundo AVRITZER (2017, p. 114), “as formas de opinião e de discussão pública características da própria organização da sociedade desaparecem na medida em que o elitismo vincula a sua teoria da racionalidade a uma diminuição da participação política”.

Não se investe em formação e educação política do povo, não se prioriza a transparência nem das campanhas e tampouco da posterior atuação legislativa, e, com isso, a população vai perdendo gradativamente a confiança nas instituições democráticas, contribuindo para o acirramento da crise de representatividade à medida em que se desinteressa pela “política” ou desenvolve até mesmo aversão a ela.

As revoluções que precederam o constitucionalismo serviram para libertar o povo, mas falharam em viabilizar um espaço onde se pudesse exercer essa liberdade (no sentido de liberdade pública), como bem lembrado por ARENDT (2011, p. 297), na medida em que apenas os representantes do povo e não o próprio povo têm oportunidade de se engajar e expressar suas opiniões em um debate público.  

É preciso, portanto, se desvencilhar da herança deixada pelo “elitismo democrático” e adicionar ao modelo representativo instrumentos de participação popular que viabilizem esse debate e que aproximem a atuação dos representantes eleitos aos pleitos populares.

As mais modernas teorias democráticas, que procuram acompanhar a concepção de vida globalizada, tecnológica e cada vez mais interativa da sociedade atual já reconhecem a necessidade da construção de uma democracia mais participativa, sob pena de sua própria implosão.

Desde ARENDT[17] até DAHL, vem se formando um consenso em torno da ideia de que todos os indivíduos são suficientemente qualificados para participar das decisões coletivas da sociedade, de uma forma ou de outra: seja através de associações, formações de conselhos municipais, assembleias, o que importa é o debate público, que se qualifica na proporção em que se amplia.

Ao contrário do Poder Judiciário, o Poder Legislativo é a instituição que deve estar sempre o mais próximo possível da opinião pública, já que seu papel é justamente o de representar a vontade popular! – desde que respeitando, é claro, os direitos fundamentais, a Constituição Federal e as minorias.

Entretanto, a maioria das democracias representativas, não apenas a brasileira, carecem de mecanismos de controle popular e falham pela ausência de exigibilidade de prestação de contas (accountability) que permitam aos representados fiscalizar a atuação daqueles a quem delegaram poderes de representação.

Eis porque a democracia representativa, embora de inegável importância, não conseguirá sobreviver sem que se alterne com institutos de democracia direta efetivos.

O orçamento participativo, os conselhos municipais, as leis de iniciativa popular, plebiscitos, referendos, o veto popular[18] e até mesmo o recall[19] (ou plebiscito revogatório), se bem articulados com o modelo de democracia representativa, podem ser primordiais na diminuição do déficit democrático e na retomada da confiança da sociedade em suas instituições democráticas.

A obrigatoriedade de se consultar a população sobre uma proposta de emenda constitucional, por exemplo, seria de primordial importância para que o povo, por meio de um debate contínuo, pudesse verdadeiramente se apropriar do conteúdo do texto constitucional, de modo que eventuais mudanças, se aprovadas, seriam incorporadas com real força normativa pela sociedade.

Embora (infelizmente) não seja o caso do Brasil, os referendos ou plebiscitos obrigatórios para propostas de emendas constitucionais são utilizados em países das mais diversas culturas, como Uruguai, Bolívia, Suíça, França, Espanha, Estônia, Uganda, Austrália, Coreia do Sul e Taiwan[20].

Na Colômbia, referendos nacionais sobre temas de relevância cidadã podem ser convocados por 10% dos eleitores (artigo 32 da Lei de Participação Cidadã), enquanto que na Bolívia essa iniciativa é possível desde que com o endosso de 20% do eleitorado nacional (Lei do Regime Eleitoral). E de um modo geral, no contexto mundial, os referendos, plebiscitos e até mesmo projetos de lei, quando partem de iniciativa popular, além do percentual mínimo de assinaturas, têm apenas algumas limitações temáticas, sendo vedado que disponham sobre tributos, orçamento, anistia, defesa, e questões de competência exclusiva do Poder Executivo.

Não é o que acontece no Brasil, em que a iniciativa para convocação de plebiscitos e referendos cabe ao próprio Congresso Nacional, um empecilho institucional que retira dos cidadãos a autonomia para dispor de tais mecanismos de democracia direta e explica o seu raríssimo uso desde a promulgação da Constituição de 1988: em nível nacional, tivemos apenas um plebiscito em 1993 (parlamentarismo x presidencialismo) e um referendo em 2005 (desarmamento).

Com relação a projetos de lei de iniciativa popular[21], além do problema da falta de mobilização e organização social e da crescente aversão à política, o que desestimula sua propositura, o Brasil ainda enfrenta óbices burocráticos ou institucionais quando finalmente se consegue reunir 1% do eleitorado em torno de uma pauta legislativa: nas quase trinta décadas de vigência da atual Constituição, apenas quatro[22] leis de iniciativa popular foram aprovadas no Congresso Nacional, todas seguindo o processo legislativo ordinário, já que tiveram que ser “adotadas” por algum parlamentar, como se de sua autoria fosse, pela impossibilidade alegada pela Câmara dos Deputados de se conferir manualmente a autenticidade de todas as assinaturas (mais de um milhão).

Um projeto de lei[23] (PLS nº 267/2016) já aprovado no Senado e remetido para a Câmara dos Deputados institui a assinatura digital/eletrônica como meio válido para propositura de projetos de iniciativa popular, a exemplo do que ocorre em outros países como a Estônia, o que eliminaria parte das barreiras à participação direta, mas não solucionaria de todo o problema, já que a dificuldade prévia de se mobilizar 1% do eleitorado nacional, distribuído em pelo menos cinco Estados, e com não menos do que 0,3% do eleitorado de cada Estado remanesce (artigo 61, §2º da Constituição Federal).

A insuficiência de associações civis relevantes e organizadas em torno de pautas de interesse público, que poderiam aglutinar os cidadãos para a propositura de mais projetos de lei, talvez decorra justamente da falta de espaço para o debate público no Brasil e pelo desuso dos demais mecanismos de democracia direta previstos na Constituição.

Associações como a “America Speaks” e a “Partipatory Politics Foundation”, nos Estados Unidos, dedicam-se a promover o engajamento cívico dos norte-americanos no debate público. Desta última brotou a iniciativa do “Open Congress”, um portal multifuncional que permite aos cidadãos opinar sobre projetos de lei em tramitação.

Exemplos semelhantes de assembleias populares formadas para fiscalizar e cobrar resultados do parlamento se proliferam por todo o mundo, como o Parlamento dos Cidadãos, na Austrália, a Plataforma Demos, na Argentina, e o Parlamento Jovem, na Inglaterra. Este último é notável pelo espaço que abre às pautas da juventude na agenda legislativa.

O que se verifica, pelas experiências ao redor do mundo, é que a organização da sociedade em torno de associações civis viabiliza o debate público, constrangendo os representantes eleitos ao respeito à soberania popular na abordagem das questões mais relevantes. De outro lado, a falta de hábito e o desuso dos mecanismos de democracia direta no Brasil são fatores que dificultam a aglutinação espontânea e o engajamento cívico dos cidadãos. Como quebrar esse ciclo? Eis o busílis.

 

5. A REVOGAÇÃO POPULAR DE MANDATOS COMO UMA PROPOSTA PARA A EFETIVIDADE DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

 Os laços entre o Estado e o cidadão são enfraquecidos quando este não tem mais confiança em seu próprio poder soberano: a indiferença dos representantes eleitos com relação às demandas daqueles que os elegeram, a ausência de prestação de contas dos mandatos, a falta de espaços para debates públicos e engajamento cívico, tudo isso gera não só uma crise representativa, mas também a disseminação de um perigoso sentimento de aversão à política, o que coloca em jogo a sustentabilidade da própria democracia.

Esse sentimento “antipolítico” costuma ser um prelúdio de regimes tirânicos e autoritários, pois, como bem observa BORDONI (2016, p. 25), a rejeição da política acaba por exaltar figuras carismáticas capazes de atrair a afeição das massas, conduzindo-as à aceitação de uma “ditadura do homem forte”, aquele que seria o único capaz de assumir a “desencorajadora tarefa de endireitar as coisas”.

E mais: quando a relação entre Estado e cidadania está deteriorada, abre-se espaço para que correlações de forças que concentram o poderio econômico se aglutinem em torno de figuras cativas com pautas populistas ou nacionalistas, que encantarão o povo com discursos absurdamente passionais, ao mesmo tempo em que executarão as agendas das elites minoritárias.

Na história recente do Brasil, não há como se esquecer do “caçador de Marajás” Fernando Collor de Melo, um produto alçado pela mídia aliada ao poderio econômico que, após ser eleito presidente da República, veio a sofrer um “impeachment” justamente por denúncias de corrupção.

Nos tempos atuais, é comum a eleição (tanto para mandatos executivos como legislativos) de figuras que paradoxalmente se classificam como “não políticas”, geralmente empresários e celebridades, mas em muitos casos com pautas assustadoramente neoliberais ou ultranacionalistas, para não dizer xenofóbicas – como foi o caso de Donald Trump nos Estados Unidos.

A decepção e, principalmente, a apatia popular que se sucede quando a figura do “herói” não atende às expectativas, mas, pelo contrário, passa a usar do seu super empoderamento para suprimir direitos fundamentais, descumprindo inclusive com compromissos programáticos, leva a um “processo de desdemocratização, em que a substância da democracia desaparece, sem que se dê sua extinção formal”, e o Estado Democrático de Direito é superado pela pós-democracia, como bem aponta CASARA (2017, p. 36).

Esse tipo de situação geralmente tem espaço em Estados onde não existe incentivo à participação popular na esfera pública de debate e, principalmente, onde não são previstos mecanismos de controle ao exercício do poder delegado.

As patologias da representatividade surgem a partir do momento em que o cidadão, em tese detentor do poder soberano, elege um representante para exercê-lo em seu nome por um período de quatro anos (ou mais, no caso do Senado), sem que lhe seja permitido contudo um controle permanente e uma fiscalização sobre o leal uso desse poder.

Sabendo que só prestarão contas nas próximas eleições, e ainda se locupletando da baixa compreensão política da população, justamente pela falta de transparência e de exigências de accountability no sistema jurídico-político brasileiro, boa parte dos eleitos usam dos mandatos para interesses próprios, quedando-se indiferentes frente a temas centrais para a população e, esquecendo-se dos compromissos programáticos e das propostas apresentadas no período eleitoral, atuam na flexibilização de direitos fundamentais em prol do poder econômico-financeiro.

Como bem alerta PINZANI (2012, XXIII)[24], não há soberania popular sem uma esfera pública capaz de ampliar o processo decisório, donde se faz necessária uma relação de influência recíproca entre esfera pública informal, por um lado, e órgãos deliberativos institucionalizados, por outro, para que o processo decisório dos parlamentos “se torne transparente e aberto à discussão, sendo influenciado pela opinião pública geral e não somente por interesses particulares organizados (por lobbies ou por entidades patronais etc)”.

Eis porque, além da potencialização e concretização dos instrumentos de democracia direta já previstos no artigo 14 da Constituição Federal brasileira (referendo, plebiscito, iniciativa popular), seria importante a inclusão de um mecanismo de controle que permitisse a revogação popular dos mandatos daqueles que eventualmente deixassem de ser transparentes e comprometidos com o programa para o qual foram eleitos.

A possibilidade de um monitoramento mais próximo dos titulares do poder sobre os atos de seus representantes eleitos poderia gerar dois efeitos benéficos à democracia: (i) maior transparência e fidelidade do mandatário com os compromissos programáticos apresentados na campanha e com as demandas da sociedade; (ii) aumento da participação e da qualificação do eleitor para o debate público.

A revogação popular de mandatos, adotada originalmente nos Estados Unidos com o nome de recall, já foi introduzida em recentes constituições latino-americanas (Colômbia, Venezuela, Equador e Bolívia) e em outros países do mundo (Suíça, Coréia do Sul, Taiwan, Filipinas, Uganda etc), traduzida no Brasil com as mais diversas denominações terminológicas, tais como voto revogatório, direito de revogação individual e coletivo, plebiscito destituinte, plebiscito de confirmação de mandato, referendo revogatório,  voto destituinte, plebiscito de confirmação de mandato, deseleição, plebiscito por autoconvocação popular, destituição etc.

No direito comparado existem previsões de revogação popular de mandatos em todas as esferas: executivo, legislativo e judiciário. Porém, no caso do Brasil, em que deputados e vereadores são eleitos pelo sistema proporcional em lista aberta (conjugação das fórmulas de quocientes eleitoral e partidário), a possibilidade de recall no âmbito legislativo poderia ser mais prejudicial do que benéfica à democracia, se ocorresse antes de uma reforma no sistema eleitoral, já que o instrumento poderia ser manejado por grupos dominantes para alijar representantes das minorias.

Sob esse aspecto, a alteração do sistema eleitoral brasileiro para o sistema proporcional em lista aberta ou sistema eleitoral misto, além de contribuir para a diminuição do déficit democrático per se, também abriria a possibilidade de adoção do recall para controle social dos mandatos no parlamento.

Contudo, ainda assim há riscos que devem ser calculados e evitados antes de se pensar na adoção desse instituto.

O primeiro desafio é pensar em como preservar uma certa independência no exercício do mandato e evitar que os representantes apenas adotem medidas populistas – e não as necessárias, engessados que ficariam pelo receio de comoções populares momentâneas e pela ameaça constante da perda do mandato.

Em segundo lugar, é preciso evitar que a convocação do recall se torne instrumento corriqueiro de oposição, revanche eleitoral ou terceiro turno – que, aliás, guardadas as devidas proporções e considerando as diferenças entre os institutos, foi o que aconteceu no caso do impeachment de Dilma Rousseff, em 2016.

Da mesma forma, há que se proteger as minorias do uso desse instrumento como meio de perseguição aos seus representantes eleitos, seja pela maioria, seja pela correlação de forças entre determinados grupos organizados: por exemplo, a união de setores religiosos para revogar o mandato um deputado favorável à legalização do aborto.

É importante, portanto, que a revogação popular de mandato seja tratada como uma medida excepcional e acionada apenas quando o representante eleito não obedeça a condutas mínimas de probidade, eficiência e fidúcia perante a sociedade, ou diante de uma grande crise de representatividade.

Outrossim, necessário se faz estabelecer algumas limitações ao instituto, de forma a minorar eventuais efeitos sistêmicos indesejados: (i) quórum elevado de assinaturas para a convocação do recall; (ii) necessidade de motivação do pedido; (iii) cláusula de vedação temporal: impossibilidade de deflagrar o procedimento revocatório antes do primeiro ano de mandato e durante o último ano; (iv) permissão de apenas um processo revogatório por mandato; (v) previsão de eleições sucessivas/simultâneas para preenchimento do cargo vago (até mesmo para evitar uma conspiração de suplentes ou vices na deposição dos titulares); (vi) no caso do Brasil, para que fosse possível também revogar mandatos legislativos, a instituição do recall deveria ser precedida por uma reforma política que alterasse o sistema eleitoral – de proporcional para distrital, ou distrital misto.

Há que se considerar, portanto, que, adotadas as devidas precauções, e precedida de uma reforma político-eleitoral estrutural, a revogação popular de mandatos (recall) pode contribuir decisivamente para a aproximação entre a sociedade e seus representantes eleitos, à medida em que impulsionará uma prestação de contas interativa e real entre as partes e exigirá uma lealdade real aos programas apresentados pelos partidos e candidatos em suas campanhas.

 

6. CONCLUSÃO

 O modelo democrático que, no século XX, revolucionou os Estados ainda estrangulados por governos autoritários ou absolutistas, encontra-se hoje em uma grande encruzilhada: ou ele se adapta às demandas de uma nova sociedade pautada pela tecnologia e pela velocidade das informações das redes sociais, ou ele se autodestruirá, levando o mundo para a pós-democracia.

A democracia baseada apenas no modelo representativo não atende mais às demandas sociais por participação e interação nas tomadas de decisão: se hoje todos se sentem empoderados por poder opinar (e serem ouvidos) sobre os mais variados temas nas redes sociais, não há como se interessarem por qualquer outro espaço em que não tenham um mínimo de voz ou possibilidade de cooperar.

Resta saber, portanto, se essa “esfera pública virtual” será incorporada pela democracia ou será responsável pelo seu esvaziamento completo.

Além da falta de espaço para deliberação pública sobre os temas relevantes para a sociedade, considerando-se que as tomadas de decisões ficam restritas aos gabinetes e às portas – muitas vezes fechadas – dos imponentes prédios públicos, o desinteresse pela política e o déficit democrático explicam-se muito pela falta de transparência e compromisso dos representantes eleitos durante o curso de seus mandatos.

Eis porque, além da necessidade de se potencializar os mecanismos de democracia direta já previstos na Constituição Federal de 1988, como a iniciativa popular, o referendo e o plebiscito, cujos entraves burocráticos os colocaram praticamente em desuso, é necessário também permitir à população uma forma de revogar os mandatos daqueles que descumprirem com os compromissos programáticos assumidos previamente.

A possibilidade mesma de ser destituído do mandato caso se distancie daqueles que lhe delegaram o poder levará o agente político a se abrir ao debate público e, em consequência, os demais instrumentos de participação popular serão naturalmente viabilizados.

Apesar de ser necessário criar limites também para evitar que a revogação popular de mandatos ofenda a liberdade parlamentar ou seja manipulada em prol de revanchismos eleitorais, sabe-se que a sua adoção, desde que revestida do caráter de excepcionalidade, poderá ser a solução para corrigir desvios e abusos do sistema representativo.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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 [1] ROTHMAN, Paula. 2016, A recessão democrática – o americano Larry Diamond, professor na Universidade Stanford e conselheiro das Nações Unidas, explica por que a democracia sofreu um retrocesso no mundo na última década. Revista EXAME CEO, p.22.

[2] É possível fazer download da pesquisa Latinobarometro 2017 no sítio eletrônico: http://www.latinobarometro.org/latNewsShow.jsp

[3] Atrás até dos 22% de satisfação na Venezuela, que a maior parte dos governos e da mídia ocidental classifica como ditadura.

[4]http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/10/1930841-brasil-tem-pior-democracia-da-america-latina.shtml.

[5] Do ponto de vista histórico, o Estado Democrático de Direito representa a superação do modelo de Estado Social de Direito. Isso porque este acabou por ver-se superado na medida em que não chegou a realizar tudo que apregoara.

[6] Entretanto, apesar da aparente proximidade com a noção de democracia direta da atualidade, não se deve deixar de levar em consideração que a noção de povo adotada no período grego não é a mesma de hoje que tem no termo sentido mais amplo do que o adotado naquele período.

[7] A democracia usualmente é classificada em direta e indireta, sendo a primeira aquela em que o povo participa sem intermediários na tomada de decisões políticas e a segunda, aquela em que um representante, escolhido por ele, representará sua vontade. Nos Estados Democráticos da atualidade, adota-se a democracia semidireta (ou semi-indireta), sendo aquela que se efetiva por meio de ambas as formas, ainda que, contudo, seja preponderante a forma de participação indireta (representativa).

[8] A democracia direta teve como seu principal defensor Rousseau, que acreditava ser o modelo ideal, pois o povo decidiria sem intermediários.

[9] E, ainda, no mesmo sentido, Tercio Sampaio Ferraz Júnior coloca que a democracia direta “é aquela em que os participantes do grupo social votam diretamente as leis que o governam. Em tese, pelo menos em comunidades pequenas, pode-se, eventualmente, suprimir a mediação, não se precisa de representantes” (FERRAZ Jr., Tercio Sampaio. Constituinte, Assembleia, Processo, Poder. São Paulo: RT, 1985, p.21).

[10] In ROTHMAN, Paula. 2016, A recessão democrática – o americano Larry Diamond, professor na Universidade Stanford e conselheiro das Nações Unidas, explica por que a democracia sofreu um retrocesso no mundo na última década. Revista EXAME CEO, p.22.

[11] Acredita-se que só seja possível identificar a democracia direta em Landsgemeinde, que ainda se encontra em alguns Cantões suíços. E, ainda sim, com questionamentos sobre a aparente decisão do povo nesses casos. (DALLARI, Dalmo de Abreu. 2012, Elementos de Teoria Geral do Estado. São Paulo: Saraiva, p.153).

[12] Prevê a Constituição Federal (artigo 14), ao lado dos sistemas de representação política, que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante plebiscito, referendo e iniciativa popular.

[13] O declínio da democracia semidireta encontra-se ligado à confiança desmedida que se depositou nos partidos políticos como remédio para os problemas de representatividade, bem como à confiança que estes têm recebido no exercício de uma missão para qual todos os povos democráticos transferiram a parte mais considerável de suas forças.

[14] Vale aqui fazer uma ressalva para os riscos de uma “democracia plebiscitária”, destacados por DALLARI (2012, p. 154), para quem “o povo poderá ser mais facilmente enganado e envolvido do que nos Parlamentos, pois não é difícil direcionar o plebiscito, fazendo-se a consulta sem dar ao povo todos os elementos necessários para uma decisão bem informada e consciente”.

 [15] Verificar as seguintes leis: Lei n.8930/94 (Projeto de Iniciativa Popular Glória Perez); Lei n.9840/99 (captação de sufrágio); Lei n.11124/2005 (Fundo Nacional para Moradia Popular); Lei Complementar n.135/2010 (Ficha Limpa).

[16] AVRITZER, Leonardo. 2017, A Moralidade da Democracia: ensaios em teoria habermasiana e em teoria democrática. Perspectiva: São Paulo. p. 113.

[17] “As opiniões se formam num processo de discussão aberta e debate público, e onde não existe oportunidade de formar opiniões podem existir estados de ânimo – ânimo das massas, ânimo dos indivíduos, este tão volúvel e inconfiável quanto aquele -, mas não opinião”. (ARENDT, Hannah. 2011, Sobre a Revolução. 1ª Ed. São Paulo: Cia das Letras.)

[18] O veto popular configura-se na participação popular quando após a edição de uma lei concede-se aos eleitores um prazo, que pode variar de sessenta a noventa dias, para que os cidadãos a aprovem. Dessa forma, a lei não entra em vigor antes de decorrido esse prazo e, desde que haja a solicitação por um certo número de eleitores, ela continuará suspensa até as próximas eleições, quando então o eleitorado decidirá se ela deve ser posta em vigor ou não. No direito norte-americano é denominado mandatory referendum.

[19] O recall realiza-se de duas formas distintas e permite que o povo revogue um mandato político ou reforme uma decisão judicial tendo como fundamento um fato censurável. Sua origem encontra-se no direito norte-americano. Inclusive, pode ser utilizado nas situações em que um magistrado não aplica uma determinada lei por considera-la inconstitucional, mas os eleitores, uma vez decididos pela sua constitucionalidade, obrigam o magistrado a aceita-la.

[20] Os dados referentes às democracias diretas em outros países foram extraídos de uma pesquisa disponibilizada pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, acessível através da página oficial. (BICHARA, Carlos David Carneiro. 2017, Experiências de Democracia Direta e Participativa ao Redor do Mundo: Mecanismos Tradicionais e Experimentos Democráticos”. Câmara dos Deputados, Consultoria Legislativa. http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/33460)

[21] Segundo João Trindade Cavalcante Filho, existem dois sistemas de tratamento da iniciativa popular no Direito Comparado: a iniciativa não vinculante e a semivinculante: a) no caso da iniciativa semivinculante, uma vez apresentado o projeto por iniciativa popular, o Legislativo ou deverá submetê-lo à decisão do povo necessariamente, ou precisará fazê-lo se rejeitar a proposição ou apresentar um “contraprojeto” (substitutivo); b) já nos países em que a iniciativa não vincula o Parlamento, o mais comum é que não haja limitações materiais ao poder de emenda, ou mesmo ao destino do projeto, salvo, no máximo, a estipulação de prazo para que o Legislativo delibere sobre o tema. (in “Iniciativa popular e desvirtuamento do projeto pelo legislativo: limites e perspectivas de soluções no Brasil e no Direito Comparado”, https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td223 )

[22] Lei nº 8.930/1994 (inclusão de homicídio qualificado no rol de crimes hediondos), Lei nº 9.840/1999 (combate à compra de votos), Lei nº 11.124/2005 (criou o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social, para garantir moradia popular), Lei Complementar 135/2010 (a Lei da Ficha Limpa).

[23] http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/126333

[24] PINZANI, Alessandro. Apresentação à edição brasileira. In: HABERMAS, Jürgen. 2012, Sobre a Constituição da Europa. São Paulo: UNESP, pp. XI-XXI.

 

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ARAUJO, Gabriela Shizue Soares de; BASTOS, Juliana Cardoso Ribeiro. A democracia participativa e a revogação popular de mandatos (recall) : alternativas ao déficit democrático brasileiro. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais – RBEC, Belo Horizonte, ano 12, n. 42, p. 89-112, set./dez. 2018.    

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